Técnicas

Tronco

Bloqueio do plano transverso abdominal

INTRODUÇÃO

O bloqueio do plano transverso abdominal (TAP Block) guiado por ultrassom é considerado tecnicamente como um bloqueio de nível médio de dificuldade. Ao contrário das técnicas que abordam o nervos periféricos este é considerado um bloqueio compartimental. Assim, após a identificação do plano interfascial entre os músculos oblíquo interno e transverso abdominal é depositada a solução de anestésico local que por dispersão banha os ramos ventrais das raízes de T6 a L1. Descrito originalmente baseado em referências anatômicas e na sensação tátil de clicks fasciais esta técnica apresentava riscos potenciais como a perfuração de visceras abdominais e a identificação incorreta do plano transverso com falha de bloqueio. Com o advento da ultrassonografia possivelmente espera-se uma diminuição destes riscos o que explica o incremento da popularidade deste bloqueio na prática anestésica. Este bloqueio está indicado como parte de uma estratégia multimodal de analgesia para cirurgias parietais abdominais como apendicectomia, colecistectomia aberta, herniorrafia inguinal, hepatectomia e colectomia.

ANATOMIA E SONOANATOMIA DA PAREDE ABDOMINAL

Os ramos ventrais das raízes de T6 a L1 seguem um trajeto anterior e lateral desde sua origem até a linha alba. Estes nervos estão contidos no plano interfascial entre os músculos oblíquo interno e transverso abdominal, próximo a linha axilar média emitem um ramo lateral e na proximidade da linha média um ramo cutâneo anterior. O bloqueio do plano transverso abdominal foi originalmente descrito por McDonnell and Rafi em 2011 dentro dos limites do triângulo de Petit. Este é limitado pela crista ilíaca inferiormente, pela borda posterior do músculo obliquo externo anterior e pelo músculo grande dorsal posteriormente e contém pequenos vasos subcostais. Nesta localização os nervos tóracolombares ainda não se encontram no plano transverso abdominal. Estes nervos entram no plano transverso abdominal nas proximidades da linha axilar média sendo bloqueados através dispersão da solução de anestésico local injetados mais posteriormente à esta referência anatômica. Os ramos ventrais de T6-T9 emitem ramos comunicantes com nervos intercostais e subcostais formando um plexo intercostal enquanto os ramos de T9-T12 contribuem para o plexo do plano transverso abominal lateralmente à artéria ilíaca circunflexa profunda e para o plexo da bainha do reto. A dispersão do anestésico local no plano transverso não é tão cefálica como sua descrição original pretendia. Quando realizado na região lombar entre o gradil costal e a crista ilíaca e na proximidade do músculo quadrado lombar observasse a um bloqueio mais consistente do ramos de T10-L1. Desta forma, para o bloqueio adequado dos ramos ventrais de T6-T9 a técnica deve ser modificada e abordar o plano transverso abaixo do gradil costal e lateralmente ao músculo reto abdominal.

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TÉCNICA DE BLOQUEIO DO PLANO TRANSVERSO “TAP BLOCK”

TAP POSTERIOR

Após assepsia e antissepsia da pele, infiltre com 1-2 ml de lidocaína 1% sem vasoconstritor no ponto medial do transdutor.

Identifique as camadas musculares compostas pelos músculos oblíquo externo, oblíquo interno e transverso, limitados lateralmente pelo músculo quadrado lombar.

Insira uma agulha eletricamente isolada 22G ou de Touhy de 100 mm de medial para lateral, ao longo do eixo maior do transdutor procurando alinhá-la ao feixe de ultrassom.

Através da progressão rastreada da agulha de bloqueio atravesse os músculos oblíquos externo e interno e suas fáscias e introduza a ponta da agulha no plano fascial entreos músculos oblíquo interno e transverso abdominal.

Injete de 1-2mL de solução salina para identificar corretamente o plano transverso abdominal (hidrodissecção) e depois de confirmado o posicionamento correto da ponta da agulha administre de15- 20 mL de solução de anestésico local em alíquotas de 3-5 mL após aspiração da seringa.

Durante a injeção da solução de anestésico local deve-se observar um alargamento anecóico entre os músculos oblíquo interno e transverso.

Caso a dispersão do anestésico local não afaste os músculos oblíquo interno e transverso provalmente se explica pela injeção intramuscular requerendo reposionamento da agulha.

Esta técnica possibilita o bloqueio unilateral dos ramos ventrais de T10-L1 sendo apropriada para cirurgias infraumbilicais.

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TAP SUBCOSTAL OBLÍQUO

 Após assepsia e antissepsia da pele, infiltre com 1-2 ml de lidocaína 1% sem vasoconstritor no ponto medial do transdutor.

Identifique as camadas musculares compostas pelos músculos oblíquo externo, oblíquo interno e transverso, limitados medialmente pelo músculo reto abdominal.

Insira uma agulha eletricamente isolada 22G ou de Touhy de 10 cm de medial para lateral, ao longo do eixo maior do transdutor procurando alinhá-la ao feixe de ultrassom.

 Através da progressão rastreada da agulha de bloqueio atravesse os músculos oblíquos externo e interno e suas fáscias e introduza a ponta da agulha no plano fascial entreos músculos oblíquo interno e transverso abdominal.

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Injete de 1-2mL de solução salina para identificar corretamente o plano transverso abdominal (hidrodissecção) e depois de confirmado o posicionamento correto da ponta da agulha administre 15-20 mL de solução de anestésico local em alíquotas de 3-5 mL após aspiração da seringa.

Durante a injeção da solução de anestésico local deve-se observar um alargamento anecóico entre os músculos oblíquo interno e transverso.

Caso não seja possível a identificação do músculo transverso  a injeção do anestésico local pode ser feita entre o corpo do músculo reto abdominal e a cápsula posterior da bainha do reto.

Esta técnica possibilita o bloqueio unilateral dos ramos ventrais de T6-T10 sendo apropriada para cirurgias supraumbilicais.

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Abreviações: OE; músculo obíquo externo abdominal, OI; músculo oblíquo interno abdominal, Transv; músculo transverso abdominal.

DICAS DE BLOQUEIO

Utilize a técnica de hidrodissecção para identificação correta do plano transverso abdominal sem desperdiçar a solução de anestésico local.

Utilizar as abordagens subcostal oblíqua e posterior, conjuntamente em cirurgias com incisões verticais que se extendam de T7 a T12.

Administrar volumes máximos de 25 a 30 mL de anestésico local quando utilizar as abordagens posterior e subcostal combinadas e de 30 a 40 mL nos bloqueios bilaterais.

Bloqueio paravertebral torácico

 

INTRODUÇÃO

O bloqueio paravertebral torácico guiado por ultrassom é considerado tecnicamente como um bloqueio de nível intermediário de dificuldade. Ao contrário dos demais bloqueios periféricos que agem apenas nos ramos ventrais (somaticos) das raízes nervosas este também bloqueia os ramos dorsais (viscerais). O bloqueio paravertebral é considerado um bloqueio compartimental e após a identificação do espaço paravertebral é depositada a solução de anestésico local que por dispersão banha os ramos ventrais e dorsais das raízes de torácicas assim como a cadeia simpática torácica.
Descrito originalmente baseado em referências anatômicas e na sensação tátil de perda de resistência esta técnica apresenta riscos potenciais como pneumotórax e identificação incorreta do espaço paravertebral com falha de bloqueio. Com o advento da ultrassonografia possivelmente espera-se uma diminuição destes riscos o que explica o incremento da popularidade deste bloqueio na prática anestésica. Este bloqueio está indicado como parte de uma estratégia multimodal de analgesia para cirurgias parietais unilaterais abdominais, lombares e torácicas como colecistectomia aberta, nefrectomia, hepatectomia, mastectomias e toracotomias. Nestas cirurgias o bloqueio paravertebral torácico tem sido apontado como tendo um papel perventivo para o surgimento de dor crônica pós opertatória e de metástases (mastectomias). Suas complicações potenciais incluem pneumotórax, hematoma paravertebral, bloqueio simpático bilateral e anestesia peridural.

ANATOMIA DO ESPAÇO PARAVERTEBRAL TORÁCICO

O espaço paravertebral tem um formato em cunha sendo limitado medialmente pelo corpo vertebral, disco intervertebral e foramen intervertebral (comunicação com espaço peridural), anterior e lateralmente pela pleura, posteriormente pelo processo transverso e pelo ligamento costotransverso superior, continuando-se lateralmente como a membrana intercostal interna (continuação aponeurótica do músculo intercostal interno) até o espaço intercostal. No espaço paravertebral estão contidos nervos intercostais proximais (ramos ventrais), ramos dorais, cadeia simpática, gordura, vasos intercostais e fascia endotorácica. Os ramos ventrais das raízes de T1 a T12 seguem um trajeto anterior e lateral desde sua origem até a linha média. Estes nervos estão contidos inicialmente no espaço peridural seguindo seu trajeto no espaço paravertebral como nervos intercostais proximais e continuando no espaço intercostal. O espaço paravertebral torácico é dividido em compartimentos anterior e posterior pela fascia endotorácica que recobre a cavidade torácica internamente originando-se junto ao corpo vertebral continuando-se lateralmente até a costela e inferiormente fusionando-se à fascia transversal abdominal. A dispersão rostral e caudal do anestésico local no espaço paravertebral ocorre livremente sendo dependente de volume injetado assim como do número de níveis puncionados. Eventualmente, a dispersão da solução anetésica pode ocorrer medialmente através da fáscia pré-vertebral atingindo o espaço peridural. Nos procedimentos cirúrgicos das paredes torácica, abdominal e lombar os níveis de punção podem variar de T2 a T10 de acordo com a distribuição metamérica das áreas de inervação atingidas pela cirurgia planejada.

TÉCNICA DE VISUALIZAÇÃO

ABORDAGEM TRANSVERSAL

Posicionar o paciente em decúbito lateral, sentado ou posição prona expondo a região torácica dorsal. Defina o nível de punção através da palpação do processo espinhoso de C7 progredindo a palpação dos processos espinhosos das vértebras torácicas até identificação dos níveis desejados.
Para abordagem transversal do espaço paravertebral coloque o transdutor linear de 10-12 MHz a aproximadamente 2.5 a 3 cm lateral a linha média, e posicionado transversalmente a coluna vertebral. Em seguida posicione o transdutor levemente oblíquo paralelamente à costela.

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Identifique o processo transverso vertebral mova o transdutor cranialmente até obter um corte ultrassonográfico intercostal. Identifique o processo transverso vertebral (estrutura convexa hiperecóica com sombra acústica anterior), pleura (estrutura hiperecóica linear com mobilidade associada a respiração), musculo intercostal externo e muscúlo intercostal interno (estruturas hipoecóicas com estriações hiperecóicas) e a membrana intercostal interna (estrutura hiperecóica linear sem mobilidade).

 

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Abreviações: PT; processo transverso vertebral, EPTV; espaço paravertebral torácico, Mie; músculo intercostal externo, Mii; membrana intercostal interna.

ABORDAGEM LONGITUDINAL PARASAGITAL

Para abordagem longitudinal parasagital do espaço paravertebral coloque o transdutor linear de 10-12 MHz na linha média posicionado longitudinalmente a coluna vertebral. Deslize o transdutor lateralmente por aproximadamente de 2.5 a 3 cm.

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Identifique os processos transversos vertebrais (estruturas convexas hiperecóicas com sombras acústicas anteriores), pleura (estrutura hiperecóica com mobilidade associada a respiração), musculo intercostal externo e muscúlo eretor da espinha (estruturas hipoecóicas com estriações hiperecóicas e a membrana intercostal interna (estrutura hiperecóica linear sem mobilidade).

 

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Abreviações: PT; processo transverso vertebral, EPTV; espaço paravertebral torácico, Mie; músculo intercostal externo, LCTS; ligamento costotransverso superior

TÉCNICA DE BLOQUEIO PARAVERTEBRAL TORÁCICO (In Plane)

ABORDAGEM TRANSVERSAL

Após assepsia e antissepsia da pele, infiltre com 1-2 ml de lidocaína 1% sem vasoconstritor num ponto 1cm distante da extremidade do transdutor.

Identifique as camadas musculares compostas pelos músculos intercostal externo e intercostal interno (estruturas hipoecóicas com estriações hiperecóicas) e a membrana intercostal interna (estrutura hiperecóica linear sem mobilidade).

Identifique o processo transverso vertebral (estrutura convexa hiperecóica com sombra acústica anterior), pleura (estrutura hiperecóica linear com mobilidade associada a respiração).

Insira uma agulha eletricamente isolada 22G de 100 mm ou uma agulha de Touhy 18G de lateral para medial, ao longo do eixo maior do transdutor procurando alinhá-la ao feixe de ultrassom visualizando sua ponta e corpo. A abordagem do bloqueio paravertebral em posição prona promove uma maior área de manipulação da agulha na região medial ao transdutor facilitando sua inserção no sentido medial para lateral.

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Através da progressão rastreada da agulha de bloqueio atravesse os músculos intercostais externo e interno e introduza a ponta da agulha na membrana intercostal interna.

Injete de 1-2mL de solução salina para identificar corretamente o espaço paravertebral (hidrodissecção) e depois de confirmado o posicionamento correto da ponta da agulha administre de 20- 25 mL de solução de anestésico local em alíquotas de 3-5 mL após aspiração negativa.

A dispersão rostral e caudal do bloqueio paravertebral torácico é muito variável e dependendo da extensão da incisão cirúrgica e número de metâmeros envolvidos pode ser necessária a realização de punções em 2 ou mais níveis.

Abreviações: PT; processo transverso vertebral, EPTV; espaço paravertebral torácico, Mie; músculo intercostal externo, Mii; membrana intercostal interna.

Particularmente, preferimos não utilizar mais de 2 punções (administrando 10-12 mL em cada nível), visando maior conforto e diminuição dos riscos de complicações para o paciente.

Durante a injeção da solução de anestésico local deve-se observar um deslocamento anterior da pleura e formação de um depósito anecóico entre a pleura e a membrana intercostal interna.

Caso a dispersão do anestésico local não desloque a pleura anteriormente é aconselhável reposicionar a agulha de bloqueio.

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Abreviações: PT; processo transverso vertebral, EPTV; espaço paravertebral torácico, Mie; músculo intercostal externo, Mii; membrana intercostal interna, AL; anestésico local

ABORDAGEM LONGITUDINAL PARASAGITAL

Após assepsia e antissepsia da pele, infiltre com 1-2 ml de lidocaína 1% sem vasoconstritor num ponto a 1 cm inferior ao transdutor.

Identifique as camadas musculares compostas pelos músculos intercostal externo e intercostal interno (estruturas hipoecóicas com estriações hiperecóicas) e a membrana intercostal interna (estrutura hiperecóica linear sem mobilidade).

Identifique o processo transverso vertebral (estrutura convexa hiperecóica com sombra acústica anterior), pleura (estrutura hiperecóica linear com mobilidade associada a respiração).

Insira uma agulha eletricamente isolada 22G de 100 mm ou agulha de Touhy 18G no sentido caudal para cranial, ao longo do eixo maior do transdutor procurando alinhá-la ao feixe de ultrassom visualizando sua ponta e corpo.

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Através da progressão rastreada da agulha de bloqueio atravesse os músculos intercostais externo e interno e introduza a ponta da agulha na membrana intercostal interna.

Injete de 1-2mL de solução salina para identificar corretamente o espaço paravertebral (hidrodissecção) e depois de confirmado o posicionamento correto da ponta da agulha administre de 20- 25 mL de solução de anestésico local em alíquotas de 3-5 mL após aspiração negativa.

 

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Abreviações: PT; processo transverso vertebral, EPTV; espaço paravertebral torácico, Mie; músculo intercostal externo, LCTS; ligamento costotransverso superior, AL; anestésico local

DICAS DE BLOQUEIO

A dispersão rostral e caudal do bloqueio paravertebral torácico é muito variável e dependendo da extensão da incisão cirúrgica e número de metâmeros envolvidos pode ser necessária a realização de punções em 2 ou mais níveis.

Particularmente, preferimos não utilizar mais de 2 punções (administrando 10-12 mL em cada nível), visando maior conforto e diminuição dos riscos de complicações para o paciente.

Durante a injeção da solução de anestésico local deve-se observar um deslocamento anterior da pleura e formação de um depósito anecóico entre a pleura e a membrana intercostal interna.